FHC, naftalina pura!
Marcos Coimbra:
Conversando
com FHC
É enternecedor o carinho de nossa grande imprensa com o
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Sempre que o entrevistam, é uma conversa amena. Percebe-se a
alegria dos jornalistas em estar na sua presença.
O tom é cordial, as perguntas são tranquilas. Tudo flui na
camaradaria.
O que não chega a ser surpreendente. FHC é um boa prosa, que
sabe agradar os interlocutores.
Além de ser uma pessoa
respeitável, seja pela trajetória de vida, seja por sua maturidade.
Natural que o tratem com consideração.
Estranho é constatar que a amabilidade com que é recebido não se
estende a seu sucessor.
A mesma imprensa que o
compreende tão bem costuma ser intransigente com Lula. Para não dizer
francamente hostil e deselegante.
Quem lê o que ela tem falado a respeito do petista nos últimos
dias e o compara ao tratamento que recebe Fernando Henrique deve achar que um
deixou a Presidência escorraçado e o outro sob aplauso.
Que a população odeia Lula e adora o tucano.
Esta semana, tivemos mais um desses bate-papos. Saiu na Folha de São Paulo.
FHC discorreu sobre o Brasil e o mundo.
Falou do PSDB, de Aécio e
Serra. Meditou sobre o julgamento do mensalão com a sabedoria de quem o vê a
prudente distância.
Opinou sobre Dilma e Lula. Contou de sua vida particular, a
família e os amores.
Foi uma longa conversa, sóbria e comedida - embora com toques de
emoção.
Mas foi frustrante. Acabou sendo mais uma oportunidade perdida
para ouvir FHC sobre algumas questões que permanecem sem resposta a respeito de
seu governo.
É pena. Não está na moda “passar o Brasil a limpo”? “Mudar o
Brasil”? “Ser firmes e intransigentes com a verdade”?
Ninguém deseja que Fernando Henrique seja destratado,
hostilizado com perguntas aborrecidas e impertinentes. Que o agridam.
Um dia, no entanto, bem que alguém poderia pedir, com toda
educação, que falasse.
Que contasse sua experiência como líder do governo Sarney no Congresso, quando viu (só viu?)
mais de mil concessões de televisão e rádio fazer parte das negociações em
troca de apoio parlamentar.
Que descrevesse o projeto do PSDB permanecer no poder por 20
anos e como seria posto em prática, quais as alianças e como seria azeitado
(sem esquecer a distribuição, sem licitação, de quase 400 concessões de TVs educativas
a políticos de sua base).
Que relembrasse os entendimentos de seu operador com o baixo
clero da Câmara para aprovar a emenda da reeleição.
Quanto usou de argumentos. E o que teve que fazer para que
nenhuma CPI sobre o assunto fosse instalada.
Que apontasse os critérios que adotou para indicar integrantes
dos tribunais superiores e nomear o Procurador-Geral da República.
Que explicasse como
atravessou 8 anos de relações com o Judiciário em céu de brigadeiro.
Que refletisse sobre o significado de seus principais assessores econômicos
tornarem-se milionários imediatamente após sair do governo - coisa que, se acontecesse com um
petista, seria razão para um terremoto.
Enfim, FHC poderia em muito ajudar os amigos. Esses que fingem
ter nascido ontem e se dizem empenhados em “limpar” a política.
Bastaria que resolvesse falar com clareza.
No mínimo, diminuiria a taxa de hipocrisia no debate atual e
reduziria o papo furado. O que é sempre bom.
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